O espetáculo interno foi vencido pelo espetáculo externo. Mas não apenas por isso o BBB 14 perdeu a graça. Perdeu o que nunca teve. Adquiriu uma versão tão repetitiva e enfadonha que aos curiosos de plantão soa como referência de um programa tradicional, com espaço aberto na programação global a cada ano. Não mais a artimanha de ficar desnudo no banheiro ou se aventurar debaixo dos edredons causou impacto. Numa sociedade em que o espetáculo atingiu níveis inconcebíveis, não é mais o reality show um exemplo de exploração da imagem a todo custo. Na verdade, todo mundo espera acontecimentos que são claramente previsíveis tanto porque há mais de uma década as máscaras estão marcadas para vilões e mocinhos.
Primeiro por ser produto serial e depois por sua condição elitista, preconceituoso, um jogo de cartas previamente marcadas, o BBB 14 se tornou exemplo de algo que o tempo e a própria televisão destruíram. O esquema de votações que representa, além da audiência, um termômetro capaz de mensurar o quanto os telespectadores continuam fiéis ao programa, é mais o ponto crucial das disputas. Foi-se o tempo em que os telespectadores aguardavam o surgimento de mocinhos, vilãos, brigões e boas praças. A ideia de ser vigiado por uma câmera constrangeria, em diferentes graus, qualquer pessoa. Naturalidade ali nunca existiu.
Enquanto o apresentador Pedro Bial insiste em chamar os brothers de heróis, o jogo se transforma numa caricatura. Não que nunca o tenha sido. Mas nesta edição, com a amplitude das redes sociais, por exemplo, as discussões são cada vez mais intensas. Hoje talvez o telespectador se pergunte sobre a real intenção dos produtores e diretores do programa que certamente não é provocar o contato entre pessoas desconhecidas num espaço fechado e vigiadas por câmeras. É difícil compreender o que há de entretenimento nisso, quando já se sabe cada passo desde o primeiro dia.
Carapaça mercadológica
O BBB 14, como qualquer uma das versões anteriores, é mais um desenho esquemático duma novela construída pela edição e encaminhada por decisões de diretores, longe do conhecimento dos telespectadores. À luz da sociologia, seria interessante estudar a condição dos brothers se não houvesse a influência externa, midiática e administrativa da TV Globo. A estrutura pré-concebida não abre mão de um esquema que cria personagens diferentes das pessoas que, ao saírem da casa, não hesitarão em colocar a culpa na edição para mascarar seus erros, embora o discurso inicial seja sempre aquele de “não interpretarei personagens” ou “serei eu mesmo”.
Os reclusos na casa não são heróis, como diz Bial, porque o simples isolamento não os constitui como tal. Parece que o brasileiro aprendeu, de certa maneira, como interpretar alguns programas de TV. E se aprendeu mesmo, que compreenda os valores explícitos – se existem – e os ocultos, quase sempre envolvidos pela carapaça mercadológica e publicitária da TV Globo.
Por Mailson Ramos em 25/03/2014 na edição 791, Salvador, BA
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